Dados do Monitor do Fogo do MapBiomas mostram que mais da metade da área queimada no Brasil no ano passado fica na Amazônia
22 de janeiro de 2025
Mais de 30,8 milhões de hectares foram queimados no Brasil entre janeiro e dezembro de 2024, uma área maior que todo o território da Itália. É o que apresentam os dados inéditos da plataforma Monitor do Fogo, do MapBiomas. Esse total representa um aumento de 79% em relação ao ano de 2023, ou um crescimento de 13,6 milhões de hectares, sendo a maior área queimada registrada desde 2019 pelo Monitor do Fogo. Três em cada quatro hectares queimados (73%) foram de vegetação nativa, principalmente em formações florestais, que totalizaram 25% da área queimada no país. Entre as áreas de uso agropecuário, as pastagens se destacaram, com 6,7 milhões de hectares queimados entre janeiro e dezembro do ano passado.
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“O ano de 2024 destacou-se como um período atípico e alarmante do fogo no Brasil, com um aumento expressivo na área queimada em quase todos os biomas, afetando especialmente as áreas florestais, que normalmente não são tão atingidas. Os impactos dessa devastação expõem a urgência de ações coordenadas e engajamento em todos os níveis para conter uma crise ambiental exacerbada por condições climáticas extremas, mas desencadeada pela ação humana como foi a do ano passado”, explica Ane Alencar, diretora de Ciências do IPAM e coordenadora do MapBiomas Fogo.
Esse aumento das áreas queimadas no Brasil está associado aos efeitos acumulados de um longo período seco que afetou grande parte do país, associado ao fenômeno “El Niño” entre 2023 e 2024, classificado como de intensidade moderada a forte. Com a baixa umidade, a vegetação fica mais suscetível ao fogo.
A Amazônia foi o bioma mais afetado. Os 17,9 milhões de hectares queimados ao longo de 2024, correspondem a mais da metade (58%) de toda a área queimada no Brasil no ano passado, e é a maior área queimada dos últimos seis anos no bioma. É uma extensão maior do que o total que foi queimado em todo o país em 2023. A formação florestal foi a classe de vegetação nativa que mais queimou na Amazônia: cerca de 6,8 milhões de hectares, superando a área queimada da classe de pastagem, que foi de 5,8 milhões de hectares.
“Esse recorde na Amazônia foi impulsionado por um regime de chuvas abaixo da média histórica, agravando as condições ambientais. Um dado preocupante é que a classe de formação florestal foi a mais atingida, superando pela primeira vez as áreas de pastagens, que tradicionalmente eram as mais afetadas. Essa mudança no padrão de queimadas é alarmante, pois as áreas de floresta atingidas pelo fogo tornam-se mais suscetíveis a novos incêndios. Vale destacar que o fogo na Amazônia não é um fenômeno natural e não faz parte de sua dinâmica ecológica, sendo um elemento introduzido por ações humanas”, comenta Felipe Martenexen, da equipe do MapBiomas Fogo.
No Cerrado, 9,7 milhões de hectares foram queimados entre janeiro e dezembro de 2024, sendo que 85% (ou 8,2 milhões de hectares) ocorreram em áreas de vegetação nativa, onde houve um aumento de 47% em relação à média dos últimos 6 anos. Já o Pantanal, que teve o ápice da área queimada em agosto (648.796 hectares), teve 1,9 milhão de hectares afetados pelo fogo entre janeiro e dezembro de 2024. Esse número representa um aumento de 64% em relação à média dos últimos 6 anos, sendo que 2024 só não superou a área queimada em 2020, quando o fogo atingiu 2,3 milhões de hectares. A seca extrema de 2024, semelhante a de 2020, deixou o bioma Pantanal mais vulnerável à incidência e propagação dos focos de fogo.
Vera Arruda, pesquisadora do IPAM e da equipe do MapBiomas Fogo, explica o contexto do Cerrado: “Historicamente, o Cerrado evoluiu com queimadas naturais, geralmente provocadas por raios durante a época de chuvas. No entanto, o que temos observado é um aumento expressivo do fogo em períodos de seca, impulsionado principalmente por atividades humanas e intensificado pelas mudanças climáticas. Um dado especialmente preocupante é o avanço das áreas queimadas em formações florestais, que atingiram em 2024 o maior valor registrado nos últimos seis anos, demonstrando uma mudança na dinâmica do fogo que ameaça ainda mais a biodiversidade e a resiliência desse bioma essencial.”
Na Mata Atlântica, 1 milhão hectares foram queimados entre janeiro e dezembro, sendo que 70% da área afetada está localizada em áreas agropecuárias. A área queimada em 2024 foi maior do que a soma da área queimada entre os anos de 2019 a 2023 para o bioma. Apesar do fogo acontecer majoritariamente em áreas antrópicas, esses eventos acabam atingindo as áreas naturais. Cerca de 26% da área queimada no último ano ocorreu em áreas de campo alagado, formação florestal e formação campestre. Mais de 80% da área queimada na Mata Atlântica em 2024 aconteceu entre os meses de agosto e setembro, reflexo dos incêndios que atingiram principalmente os plantios de cana-de-açúcar no estado de São Paulo.
“As áreas naturais na Mata Atlântica não estão adaptadas ao fogo. Esses eventos acabam trazendo grandes impactos aos escassos remanescentes florestais dentro do bioma. Além dos prejuízos ambientais, como alteração na regulação do clima, manutenção do ciclo da água e qualidade do solo, são evidentes os danos econômicos e, principalmente, os danos para a saúde e bem-estar da população”, aponta Natalia Crusco, da equipe da Mata Atlântica do MapBiomas.
No Pampa, a área queimada em 2024 foi de 3,4 mil hectares, sendo o menor valor dos últimos seis anos. Houve redução também na Caatinga, onde 330 mil hectares foram queimados entre janeiro e dezembro de 2024 – uma diminuição de 47% em relação ao mesmo período de 2023. A maior parte (81,8%) das queimadas esteve concentrada em formações savânicas.
“Normalmente a proporção de área queimada no Pampa é baixa. Em 2024 foi o menor valor na série monitorada desde 2019. Esse padrão está associado aos fortes efeitos do fenômeno El Niño, que no sul do Brasil se manifesta de modo inverso Houve grandes acumulados de chuva no primeiro semestre de 2024, quando notavelmente ocorreram as enchentes de maio de 2024. Por outro lado, as condições favoráveis ao acúmulo de biomassa vegetal em 2024 podem aumentar o risco do aumento das queimadas a partir de 2025 com a confirmação do fenômeno La Niña, que provoca períodos de seca e facilita a propagação do fogo”, afirma Eduardo Vélez, da equipe do Pampa do MapBiomas.
O Pará foi o estado que mais queimou no ano passado, com 7,3 milhões de hectares ou 24% do total nacional. Em seguida vêm Mato Grosso e Tocantins, com 6,8 milhões e 2,7 milhões de hectares, respectivamente. Juntos, esses três estados responderam por mais da metade (55%) da área queimada em todo o ano passado. Entre os municípios, São Félix do Xingu (PA) e Corumbá (MS) registraram as maiores áreas queimadas em 2024, com 1,47 milhão de hectares e 841 mil hectares queimados, respectivamente.
Amazônia foi o bioma que mais queimou em dezembro de 2024
Em dezembro de 2024, foram queimados 1,1 milhão de hectares, o que corresponde a 3,6% de toda a área queimada no Brasil ao longo do ano. Essa área é um pouco menor que o território do Líbano. Esse total mensal representa um aumento de 79% em relação à média dos últimos 6 anos, ou 485 mil hectares acima da média. E 68% da área queimada em dezembro de 2024 ocorreram em vegetação nativa, sendo a maioria na classe de formação florestal, que representou 24,2% da área queimada no mês. Entre as áreas de uso agropecuário, as pastagens também se destacaram no mês de dezembro, respondendo por 28,4% da área queimada.
A Amazônia respondeu por 88% do total queimado em dezembro: 964 mil hectares. As florestas (incluindo florestas alagáveis) foram o tipo de vegetação nativa mais atingido, respondendo por 37,5% da área queimada em dezembro no bioma, ou 361 mil hectares queimados. Pastagem foi a classe de uso da terra mais impactada, com 29,6% da área total queimada na Amazônia em dezembro de 2024 (285 mil hectares).
O Cerrado foi o segundo bioma que mais queimou em dezembro do ano passado, com 88 mil hectares. Eles se dividiram entre áreas de vegetação nativa (50%), especialmente em formações savânicas (21,5 mil hectares), e áreas agropecuárias, principalmente em pastagens (21 mil hectares).
Em dezembro, no Pantanal, 7,6 mil hectares foram queimados, sendo 72% concentrados em formação campestre. E na Mata Atlântica, 7 mil hectares foram queimados, principalmente em agropecuária (65,7% ou 4,6 mil hectares). O Pampa, por sua vez, teve a menor área queimada dentre os biomas no mês de dezembro, com 71 hectares, e a Caatinga totalizou 32.705 de hectares queimados.
No mês de dezembro de 2024, os três estados que mais queimaram foram o Pará (407 mil hectares), o Maranhão (296 mil hectares) e o Amapá (121 mil hectares). E os três municípios com maior área queimada foram: Porto de Moz (PA), com 41 mil hectares, Almeirim (PA), com 37 mil hectares, e Tartarugalzinho (AP), com 32 mil hectares queimados.
Imagem: Edilson Dantas