21 de novembro de 2024

Entre janeiro e outubro de 2024, o Brasil queimou um Tocantins inteiro. Foram 27,6 milhões de hectares, uma área 119% maior do que o total queimado no mesmo período do ano passado. Foram 15 milhões de hectares a mais, na comparação com 2023 – mais que todo o Ceará. Os dados são do Monitor do Fogo, do MapBiomas e apontam que este foi o pior ano da série histórica, que teve início em 2019. 

O principal foco do fogo foi a vegetação nativa, que respondeu por três em cada quatro hectares queimados (74%) de janeiro a outubro. Formações florestais concentraram um quarto (25%) do total. Mais da metade (55%) de tudo que foi queimado no período foi na Amazônia: 15,1 milhões de hectares. O Cerrado vem em seguida, com 9,4 milhões de hectares, sendo que 85% (ou 8 milhões de hectares) ocorreram em áreas de vegetação nativa. Trata-se de um aumento de 97% em comparação com o mesmo período de 2023.

Acesse os dados do Monitor do Fogo de Outubro de 2024

No Pantanal, a área queimada entre janeiro e outubro de 2024 aumentou 1.017%. Foram 1,8 milhão de hectares – ou 1,6 milhão a mais que o mesmo período do ano passado. Já no caso do Pampa, os 3,2 mil hectares queimados nos dez primeiros meses do ano representam o menor valor observado nos últimos três anos, para esse mesmo período, o que decorre do maior volume de chuvas em 2024. Também houve queda na área queimada na Caatinga: foram 233 mil hectares, ou uma redução de 49% em relação ao mesmo período de 2023, embora 85% da área queimada tenha ocorrido em vegetação nativa. No caso da Mata Atlântica, foram 993 mil hectares nesse período, 71% dos quais em áreas agropecuárias.

Mato Grosso respondeu por um quarto (24%) da área queimada em todo o Brasil (6,7 milhões de hectares), seguido por Pará e Tocantins, com 6,1 milhões e 2,7 milhões de hectares, respectivamente. Juntos, esses três estados totalizaram 56% da área queimada no período. Os municípios de São Félix do Xingu (PA) e Corumbá (MS) registraram as maiores áreas queimadas entre janeiro e outubro de 2024, com 1,4 milhão de hectares e 795 mil hectares, respectivamente.

As pastagens foram as áreas de uso antrópico que mais queimaram no período, representando 21% de toda a área queimada este ano no país. Foram 5,7 milhões de hectares de pastagens queimados entre janeiro e outubro de 2024 – um aumento de 58% em relação ao mesmo período de 2023. A Amazônia foi o bioma com a maior área de pastagens queimadas nos dez primeiros meses deste ano: 4,9 milhões de hectares. As pastagens recém-plantadas foram as que mais queimaram, correspondendo a 39% do total, e na Amazônia essa proporção foi ainda maior: alcançando 86%. Com o objetivo de apresentar um panorama sobre a ocorrência de fogo em pastagens no Brasil, as equipes do MapBiomas elaboraram uma nota técnica detalhando a relação entre o fogo e as pastagens plantadas, tanto historicamente quanto em 2024. 

A incidência do fogo variou de acordo com a qualidade da pastagem. No período analisado, as pastagens de alto vigor foram as mais afetadas, representando 56% do total dos pastos afetados pelo fogo, seguidas pelas de médio vigor (31%) e as de baixo vigor (13%). A predominância do fogo em pastagens de alto vigor concentrou-se principalmente na Amazônia. No Cerrado, Caatinga e Pantanal, mais de 47% da área de pastagem queimada em 2024 ocorreu em pastagens estabelecidas entre 30 e 39 anos atrás. Na Mata Atlântica, 89% das áreas de pastagem afetadas pelo fogo em 2024 foram estabelecidas antes de 1994. 

Outubro responde por quase um quinto da área queimada este ano no Brasil 

A área queimada em outubro foi de 5,2 milhões de hectares, ou 18,8% do total registrado este ano. É como se todo o estado do Rio Grande do Norte tivesse queimado em um mês. Em comparação com 2023, houve um aumento de 42%, ou 1,5 milhão de hectares a mais. Três quartos (75%) da área queimada em outubro ocorreram em vegetação nativa, principalmente formações florestais, que responderam por 39% do total queimado no mês. Mais uma vez, as pastagens se destacam entre as áreas de uso agropecuário queimadas em outubro, com 21% do total do período. 

Quase três em cada quatro hectares queimados em outubro (73%) ocorreram  na Amazônia, onde 3,8 milhões de hectares foram queimados no mês passado – um aumento de 59% em relação a 2023. Nesse bioma, a formação florestal foi o tipo de vegetação nativa mais impactado, representando quase metade (49%) da área queimada na Amazônia em outubro (1,9 milhões de hectares). Além disso, mais de um quarto (26%) do total queimado na Amazônia foi de pastagem, que foi a classe de uso antrópico mais afetada, com 1 milhão de hectares queimados.

Pela primeira vez desde o início do monitoramento do fogo em 2019, no período de janeiro a outubro, a área de formação florestal queimada no bioma Amazônia superou a área de pastagens atingidas, revelando um avanço preocupante da destruição em regiões naturalmente preservadas.

O Cerrado é o segundo bioma com maior área queimada em outubro, com 934 mil de hectares queimados. A maioria das áreas queimadas foram em vegetação nativa (86% ou 806 mil hectares), sendo que mais da metade (52%) foram de formações savânicas (481 mil de hectares). 

No Pantanal, 261 mil hectares queimaram em outubro, ou 14% do total dos primeiros dez meses deste ano. A quase totalidade (97%) do que foi queimado no mês passado foi em vegetação nativa, sendo 36% em campo alagado e área pantanosa e 32% em formação campestre.

Na Mata Atlântica, foram queimados 96 mil hectares em outubro – um aumento de 375% em relação à média anterior. A classe antrópica mais impactada foi a cana-de-açúcar, com 30 mil hectares queimados no mês passado.

Os estados que mais queimaram nesse mês foram Pará (1,5 milhões de hectares), Mato Grosso (1,1 milhões de hectares) e Rondônia (574 mil hectares). Todos os três municípios com maior área queimada no período ficam no Pará: São Félix do Xingu (369 mil hectares), Altamira (200 mil hectares) e Novo Progresso (196 mil hectares).

Amazônia e Cerrado concentram 92% da área queimada de pastagens plantadas no Brasil desde 1985

Com base em dados históricos detalhados na nota técnica, observa-se que o fogo afetou quase metade (44%) das pastagens plantadas no Brasil pelo menos uma vez entre 1985 e 2023, ou 72,6 milhões de hectares. Nesse período, as pastagens plantadas foram a segunda classe de cobertura e uso da terra mais queimada no Brasil, atrás somente da classe de formação savânica. A maior parte desse total (68%, ou 49,3 milhões de hectares) ocorreu na  Amazônia, onde 83% dos 59 milhões de hectares ocupados por pastagens no bioma queimaram pelo menos uma vez nos últimos 39 anos. Em seguida vem o Cerrado, com 24%, ou 17,3 milhões de hectares. Embora correspondam a 67% de toda a área ocupada por pastagens plantadas no Brasil, esses biomas respondem pela quase totalidade (92%) da área de pastagem queimada no Brasil pelo menos uma vez nos últimos 39 anos.  

No caso das áreas queimadas mais de uma vez, o percentual total no Brasil é de 67%. Na Amazônia, essa recorrência foi ainda maior, com 76% das pastagens queimando duas ou mais vezes; destas, 41% queimaram entre duas e três vezes, e 34% mais de quatro vezes. No Cerrado, 20% das áreas queimadas registraram fogo duas vezes, e 32% mais de três vezes ao longo do período de análise.

Embora representem 18%, 14% e 2% da área total de pastagens plantadas do país, a Mata Atlântica e a Caatinga responderam por 3% cada, e o Pantanal por 2% da área queimada em pastagens plantadas. “A menor ocorrência de fogo nesses biomas pode estar associada tanto às suas menores extensões de pastagens plantadas quando comparadas a Amazônia e ao Cerrado, quanto às práticas agropecuárias mais consolidadas, mais capitalizadas e menos intensivas em uso do fogo, principalmente para a Mata Atlântica”, acrescenta o professor Laerte Ferreira, coordenador da equipe da pastagem do MapBiomas. 

O Pantanal apresentou a menor área de pastagens plantadas dentre os biomas analisados, mas com uma alta proporção afetada pelo fogo: 1,4 milhões de hectares foram queimados, correspondendo a mais da metade dos 2,5 milhões de hectares de pastagens plantadas existentes no bioma. Ele apresenta um padrão de recorrência intermediário: 40% das áreas de pastagens queimadas foram afetadas uma única vez, 40% registraram entre duas e três queimadas, e 20% queimaram mais de quatro vezes durante os 39 anos analisados. 

A área de pastagens queimadas variou ao longo dos anos, com uma média anual de 4,6 milhões de hectares queimados, ou um quarto da área queimada anualmente (18 milhões ha/ano). “Essa variação reflete os contextos econômicos e políticos que impulsionam as mudanças de uso da terra e as flutuações climáticas. Fenômenos como o El Niño causaram secas extremas e episódicas, impactando diretamente a extensão das áreas queimadas, especialmente em anos críticos como, por exemplo, 1987/1988, 1998/1999, 2005, 2007 e 2010, entre outros. Nesses períodos registra-se uma área queimada maior, caracterizada por picos na série temporal devido a condições de estiagem prolongada, o que aumenta a inflamabilidade da vegetação e favorece a propagação do fogo, incluindo em áreas de pastagem”,  comenta Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM e coordenadora do MapBiomas Fogo. 

Em 2023 o Brasil possuía 164,5 milhões de hectares de pastagens plantadas, ou 19% do território nacional. Elas respondem por 59% da área destinada à agropecuária no país. Desde 1985, as pastagens aumentaram em 82%, com Amazônia (59 milhões de hectares) e Cerrado (51 milhões de hectares) concentrando a maior parte dessa expansão.