Perda de 9,1 milhões de hectares de campos nativos em 38 anos
O Pampa Sul-Americano perdeu 20% de sua vegetação campestre entre 1985 e 2022, incluindo 9,1 milhões de hectares de campos nativos, segundo a análise de imagens de satélite captadas no período pelo MapBiomas Pampa, uma rede colaborativa de especialistas da Argentina, Brasil e Uruguai. Os dados sobre as transformações deste bioma, que se estende por mais de um milhão de quilômetros quadrados entre Brasil, Argentina e Uruguai, ocupando 6,1% da América do Sul, foram divulgados hoje (28/11) pelos pesquisadores. A nova coleção de mapas anuais de cobertura e uso da terra é a mais completa já elaborada para o bioma e atualiza os dados da coleção anterior, lançada no ano passado.
Os dados revelam que a vegetação nativa já cobre menos da metade do Pampa (47,4%). A maior parte dela corresponde à vegetação campestre (32% do território), e que tradicionalmente é utilizada para a pecuária. Trata-se de um caso singular em que a produção animal e a conservação da biodiversidade geralmente integram sistemas produtivos com notável sustentabilidade ambiental. Apesar disso, quase metade (48,4%) da região já teve a vegetação nativa convertida para o desenvolvimento da agricultura, pastagens plantadas ou silvicultura. As áreas de agricultura e silvicultura aumentaram 15% no período, o que significa um incremento de 8,9 milhões de hectares. Em área, o avanço da silvicultura foi menor: 2,1 milhões de hectares. Mas isso representou um crescimento de 327%. Já a vegetação campestre nativa, que é a base para a produção animal, sendo a vocação natural do bioma, caiu de 44 milhões de hectares em 1985 para 35 milhões de hectares em 2022.
>> Acesse os principais destaques do Pampa Trinacional (1985-2022)
“Vários estudos indicam que o Pampa Sul-Americano, onde predomina a vegetação nativa não florestal, é um dos biomas menos protegidos e mais ameaçados do continente, exatamente por conta das grandes taxas de transformação na cobertura e uso da terra e dos baixos níveis de proteção de seus ecossistemas naturais”, explica Eduardo Vélez, da equipe MapBiomas Pampa. Apesar de em 1985, quando inicia o período mapeado, o grau de conversão da vegetação nativa já fosse alto (40% da região com agropecuária, silvicultura e áreas urbanas), as transformações nos últimos 38 anos seguiram ocorrendo, alterando ainda mais a paisagem. Ou seja, a região ainda não estabilizou o processo de conversão dos ambientes naturais em áreas antropizadas. As consequências disso são ruins para a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos, além de comprometer o potencial regional de produzir carne de modo sustentável, em escala, a partir da vegetação campestre típica do bioma.
Brasil, maior perda proporcional
O país que teve a maior perda proporcional de vegetação campestre foi o Brasil, com 2,9 milhões de hectares – o equivalente a 58 vezes a área do município de Porto Alegre (RS). Trata-se de uma perda de 32% da área existente em 1985 em apenas 38 anos. O principal vetor dessa mudança é a expansão das áreas agrícolas para o plantio de soja. O uso agrícola do solo aumentou 2,1 milhões de hectares entre 1985 e 2022. A silvicultura, por sua vez, expandiu seu território em mais de 720 mil hectares nesse período – um aumento impressionante de 1.667%. Em 1985, a área total ocupada pelos campos era de 9 milhões de hectares e passou para 6,2 milhões de hectares em 2022.
Argentina, maior perda absoluta
Em termos absolutos, no entanto, as maiores perdas de vegetação campestre foram na Argentina: 3,7 milhões de hectares – o mesmo que 182 vezes a cidade de Buenos Aires. Foi uma perda de 16% da área em 38 anos. Em 1985, eram 23,1 milhões de hectares; em 2022, 19,4 milhões. Assim como no Brasil, o principal vetor foi a expansão das áreas de agricultura e das pastagens plantadas com espécies exóticas. “O uso agropecuário do solo teve um aumento líquido de 3,4 milhões de hectares, sendo o resultado do aumento da área de agricultura, que chegou a 5,8 milhões de hectares, combinado com a perda de 2,4 milhões de hectares de pastagens plantadas”, comenta Diego Abelleyra, do INTA-Argentina. A silvicultura, por sua vez, aumentou 317 mil hectares entre 1985 e 2022.
Uruguai, maior área de silvicultura
No Uruguai, a perda dos campos também foi muito relevante: 2,5 milhões de hectares, ou 47 vezes o departamento de Montevidéu. Foi uma queda de 20% em relação à área total de 1985, sendo um efeito combinado do avanço da agricultura e da silvicultura. Somente o uso agrícola do solo aumentou 42% entre 1985 e 2022, passando de 3,2 milhões de hectares para 4,5 milhões de hectares. Mas a grande mudança, em termos proporcionais, se deu na silvicultura, que expandiu sua área em 748%, passando de 143 mil hectares em 1985 para 1,2 milhão de hectares em 2022. A área de silvicultura no Uruguai já supera a área observada na região do Pampa da Argentina (775 mil ha) e do Brasil (762 mil ha).
Destaques
- O Pampa Sul-Americano ocupa 6,1 % (109,2 milhões de hectares) da América do Sul;
- 66% da área mapeada está na Argentina (72 milhões de hectares), 18% no Brasil (19,4 milhões de hectares), e 16% no Uruguai (17,8 milhões de hectares);
- A perda líquida de vegetação campestre entre 1985 e 2022 foi de 9,1 milhões de hectares;
- As áreas de agricultura e pastagens plantadas somadas cresceram 16%, de 43,2 milhões de hectares para 50,1 milhões de hectares e
- A área de silvicultura (os plantios de árvores exóticas) aumentou de 645 mil hectares para 2,8 milhões de hectares (aumento de 327%).
Sobre o MapBiomas Pampa Trinacional
O MapBiomas Pampa Trinacional https://pampa.mapbiomas.org/ é uma iniciativa que envolve uma rede colaborativa de especialistas da Argentina (Instituto Nacional de Tecnología Agropecuaria-INTA, Universidad de Buenos Aires e a ONG Fundación Vida Silvestre Argentina), Brasil (Universidade Federal do Rio Grande do Sul e GeoKarten) e Uruguai (Faculdade de Agronomia e Faculdade de Ciências da Universidad de la República, Instituto Nacional de Investigación Agropecuaria-INIA e Ministério do Ambiente). O projeto utiliza imagens de satélite Landsat (30 x 30 metros de resolução) e computação em nuvem por meio da plataforma Google Earth Engine (GEE) para produzir mapas anuais de cobertura e uso da terra com alta tecnologia e baixo custo. A iniciativa faz parte da Rede MapBiomas, iniciada em 2015 com o MapBiomas Brasil (mapbiomas.org).