Estudo sobre dinâmica do carbono no solo mostra que, em 2030, seriam necessários 29 milhões de hectares, ante os atuais 50 milhões de hectares, para produção de carne; pesquisa usou dados do MapBiomas
23 de julho de 2025
Em 2030, a criação de gado no Cerrado pode necessitar de apenas 58% da área que utiliza hoje para produzir a demanda estimada de carne para aquele ano, caso seja feito o manejo adequado da terra, segundo o estudo “Caminhos para Paisagens Sustentáveis: Dinâmica de Carbono em Transições de Uso e Manejo no Cerrado Brasileiro”.
A pesquisa, elaborada pelo Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig), da Universidade Federal de Goiás (UFG), e pela The Nature Conservancy (TNC Brasil), com apoio da Universidade Federal de Sergipe (UFS), foi lançada em junho, no 26º Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (FICA), na cidade de Goiás (GO).
O objetivo do estudo foi entender a dinâmica do carbono no solo e explorar o potencial do uso de pastagens degradadas para facilitar a produção futura de carne e soja, além de identificar áreas adequadas para restauração ecológica no bioma. Os pesquisadores também analisaram como essa produção futura impactará os estoques de carbono na região.
Para fazer a análise, a pesquisa utilizou o modelo ecossistêmico Century para fazer as estimativas dos estoques atuais de carbono na biomassa e no solo, para 2030 e 2050, em áreas de pastagens e de vegetação nativa, com base em sua distribuição espacial e qualidade.
Maria Hunter, coordenadora do Grupo Carbono do Lapig e uma das autoras do estudo, explica que foram utilizados dados da Coleção 7.1 do MapBiomas relacionados a áreas de ocorrência de vegetação nativa e pastagens. A plataforma também foi importante para entender quando uma determinada área deixou de ter vegetação nativa e o que ocorreu com ela – por exemplo, se virou pasto e, em seguida, área de cultivo de soja. O estudo também levou em conta informações sobre o vigor das pastagens.
Com isso, constatou-se que, com a manutenção de pastagens de alta qualidade e aprimoramento via manejo adequado dos pastos de baixa e média qualidade, a parcela do rebanho bovino brasileiro alocada ao Cerrado para o ano de 2030 (estimada em 61 milhões de unidades animais) irá requerer 29 milhões de hectares da área atualmente estimada como sendo de pastagem, que é de 50 milhões de hectares (entre pastagens de baixo, médio e alto vigor).
“Apenas melhorando a pastagem, seria necessário usar pouco mais da metade – 58% – da área atual de pasto”, destaca Hunter.
Outros 3 milhões de hectares poderiam ser alocados para a produção de soja para atender à demanda estimada do grão em 2030. Assim, restariam cerca de 18 milhões de hectares “livres” para outros usos e objetivos. “Há muitas possibilidades, seja para a agropecuária, para a produção de energia renovável ou para a recuperação da vegetação”, comenta Hunter.
Com relação ao estoque de carbono, o estudo projetou dois cenários para os anos de 2030 e 2050. No primeiro, os 18 milhões de hectares são destinados à regeneração natural, o que levaria a 0,23 gigatoneladas de carbono (Gt C) adicionais após cinco anos (em 2030) e 0,48 Gt C adicionais após 25 anos (em 2050).
No segundo cenário, 8,9 milhões de hectares são destinados à regeneração, e o restante fica como área de pastagem não melhorada. Nesse caso, o impacto sobre o estoque de carbono é menor: após cinco anos, acumula 0,15 Gt C adicionais, e mostra um aumento de 0,30 Gt C em 2050.
“O incremento de estoque de carbono nos dois cenários contribui para o enfrentamento das mudanças climáticas de duas maneiras. Primeiramente, o carbono que acumula na vegetação está (em parte) sendo retirado da atmosfera. Além disso, a regeneração de vegetação nativa pode ter efeito no clima local, com a ciclagem de mais água”, analisa Hunter.
Confira o estudo aqui.
Carbono em áreas passíveis de desmatamento
Os pesquisadores também combinaram dados do IBGE e do MapBiomas para estimar a cobertura da formação savânica no bioma e calcular estimativas de estoque de carbono. Os dados foram cruzados com declarações de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reservas Legais (RLs) que constam no Sistema de Cadastro Ambiental Rural (Sicar) e com áreas protegidas e Terras Indígenas. Com isso, constatou-se que 49% das áreas de formação savânica, que abrigam 47% do carbono no bioma, estão em regiões vulneráveis ao desmatamento.
“Temos muita área de pastagem com possibilidade de melhor uso em termos econômicos e para o produtor, assim como para o meio ambiente. Não precisa ser um contra o outro. Isso realmente é um ponto chave”, conclui.